sábado, 29 de setembro de 2007

Metade





Metade (Oswaldo Montenegro)



"Que a força do medo que tenho
não me impeça de ver o que anseio
que a morte de tudo em que acredito
não me tape os ouvidos e a boca
porque metade de mim é o que eu grito
mas a outra metade é silêncio.

Que a música que ouço ao longe
seja linda ainda que tristeza
que a mulher que amo seja pra sempre amada
mesmo que distante
porque metade de mim é partida
mas a outra metade é saudade.

Que as palavras que eu falo
não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com
fervor
apenas respeitadas como a única coisa
que resta a um homem inundado de sentimentos
porque metade de mim é o que ouço
mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora
se transforme na calma e na paz que eu mereço
e que essa tensão que me corrói por dentro
seja um dia recompensada
porque metade de mim é o que penso
mas a outra metade é um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste
e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos
suportável
que o espelho reflita em meu rosto num doce sorriso
que eu me lembro ter dado na infância
porque metade de mim é a lembrança do que fui
a outra metade não sei.

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
pra me fazer aquietar o espírito
e que o teu silêncio me fale cada vez mais
porque metade de mim é abrigo
mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta
mesmo que ela não saiba
e que ninguém a tente complicar
porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
porque metade de mim é platéia
e a outra metade é canção.

E que a minha loucura seja perdoada
porque metade de mim é amor
e a outra metade também."


Postado por Sabrina Moreira / Foto: Thaís Kachel

Triste Bahia


A vida é cheia de som e fúria. Salpicada de clichês, como esse do Shakespeare. Eu e Jéssica, minha vizinha do andar de cima, nos encontramos certa feita no elevador. Ambas com fones enfiados nas orelhas. E um papo forçado de 10 andares para baixo.

— Legal essa camiseta dos Ramones.
— Brigada, mas na verdade eu não gosto desses rock pauleira... A camiseta é do meu namorado.

Clichê número um. Todo mundo que não sabe o que é rock usa o adjetivo pauleira posposto ao substantivo em questão.

Cheguei no café para me encontrar com Maria Lúcia. Café, móveis marrons, cigarros, e jazz ao fundo, Clichê. Ela é uma daquelas modernetes que a gente gosta de olhar. Bem vestida, cabelos absolutamente mal-arrumados, uma camiseta branca, sapatilhas de leopardo.

— Tenho que escrever um livro sobre o Transa, do Caetano.
— Que merda. O Caetano é um saco, um chato. E ainda canta com aquele sotaque baiano.

Clichê número dois. Ah, juventude alienada essa minha... Concordo que é um saco, a Xuxa pariu a Sacha lá e perguntam pro Caetano o que ele acha. E sua prolixidade toda, ou não. Mas temos que concordar que pedem a opinião dele para absolutamente tudo! E o que o cara fez com os outros malucos na Tropicália... Não dá para diminuir. Até o Beck gosta, seus indies de merda, vocês deviam ouvir também.

Ontem fui ver uma banda daqui da cidade tocar. Nunca tinha ouvido, mas já conhecia de nome. Músicas para se ouvir sentado, samples emitidos a partir de um I-book, uma vocalista linda com voz desafinada. Perfeitamente inglesa.

— Mas eles só cantam em inglês?
— Claro!
Clichê número três. Português é uma péssima língua para fazer rock. Deve ser porque assim a gente entende as letras. Poesia pura...



Vanessa, apreciadora de um bom e clássico rock pauleira.


Ouça: Mais do Mesmo, Legião (um clichê)

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Cientistas alemães, mexam-se


Definitivamente. A vida deveria ter trilha sonora. Não. Não estou falando de algo abstrato como a sonoridade dos sentimentos e sensações. Estou falando música de verdade. Algo em alto e bom som. Uma trilha de verdade, como em novelas e filmes... Algo que dê mais emoção aos fatos e acontecimentos.


Vamos combinar. Todo entardecer e todo amanhecer mereceria uma orquestra sinfônica. Toda terça-feira chuvosa mereceria Maria Rita ou Mariah Carey. O sábado a noite pede Soldier of Love e Last Kiss, Pearl Jam. Toda manhã de domingo seria digna de gente animada, como Ivete Sangalo, Jota Quest ou Paralamas, isso pra falar só dos nacionais. Segunda-feira, de manhã, poderia começar com Patience, do Guns, com With or Without you na seqüência. Show, não é?


Só não sei muito bem como isto poderia funcionar... Imagine a seguinte situação: Ela, caminhando no parque. Ele, tomando uma água de coco, enquanto descansa um pouco, depois das três voltas de bike na pista do lago. Se olham, se entendem. Ela decide fazer uma pausa também. Deu sede... Mas e aí? Que música toca? A que ele escolheu, mentalmente, numa fração de segundos. Ou a que ela já tinha planejado desde o verão passado? Ou será que vem uma música ao acaso? E se ninguém gostar?... Dae ferrou!


Sinceramente, acho que o acaso seria uma boa pedida. Poderia haver gente especializada em fazer indicações. Tipo: As mais-mais, top 10, hits parade, ou algo assim... Difícil apenas seria em lugares muito cheio... Quem é que ia entender alguma coisa? Puxa vida... essa idéia é complicada. Mas bem que podia acontecer.


Talvez para resolver a situação, os cientistas alemães, mestres em soluções mirabolantes, poderiam inventar algo como um MP20. Um objeto bem pequeno, a prova da água, que pudesse ser fixado atrás da orelha, capaz de traduzir nossos sentimentos e leitura que fazemos da realidade e traduzisse em música. Algo que identificasse nossas preferências e ajustasse de acordo com a nossa percepção dos fatos. Um equipamento eficaz que, mesmo que não percebêssemos os fatos que nos cercam conscientemente, fosse capaz de nos despertar com a música. Vish. Acho que viajei.... Mas seria bem bom. Não seria?


Tudo bem. Tudo bem. É loucura, sim. Mas, vendo de perto, quem é que é normal?


Aliane Kanso

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

GOSTO SE DISCUTE SIM


Em tempos de multiculturalismo, tornou-se politicamente incorreto julgar esta, ou aquela cultura, e suas expressões artísticas superiores as demais.
Aparentemente para os adeptos desta nova forma de controle sobre o pensamento e a consciência do indivíduo, Sandy e Júnior, Ramones e Bonde do Tigrão, tem o mesmo valor que Bach, Mozart e Miles Davis.Se você concorda com os stalinistas politicamente corretos, poupe seu tempo e pare de ler este texto. Pois eu, como músico e amante da Música, discordo. Desde já, quero deixar claro que não toco música erudita ou jazz e não tenho competência para tanto. Este é justamente o ponto a que quero chegar. O grau de competência técnica necessário para se compor e tocar uma sinfonia, ou um Standard, como Giant Steps de John Coltrane é infinitamente superior ao necessário, para se tocar um blues ou um vanerão.Como disse antes, não toco Beethoven nem Gillespie, nem tenho o hábito de escutá-los freqüentemente. Na verdade, sou fanático por blues, mas isso não me impede de perceber claramente a superioridade de Brahms em relação a Hound Dog Taylor ou Eric Clapton.Essa superioridade não é puramente técnica. Enquanto a música pop (o blues, o folk, o rock e suas variantes), se limita quase que exclusivamente a tagarelar sobre o amor, com suas dores e prazeres previsíveis, ou a discursos tão passionais quanto obscuros e auto-indulgentes contra o "sistema", no mundo erudito e no jazz toda a existência humana e as questões sobre a vida, a morte e o cosmos (que qualquer ser racional faz), são abordadas de maneira freqüente.
O rock até faz estas perguntas, mas as respostas, quando dadas, se limitam a alguma forma de niilismo ou hedonismo. E é aqui, que a superioridade técnica de músicos como Schubert e Charles Parker faz toda diferença. A vida nos apresenta questões complexas, as respostas, se é que existem, não podem ser simples.Os três acordes do punk podem responder a alguns anseios e angústias juvenis, mas teriam sido muito pouco para Beethoven expressar sua admiração pela filosofia de Immanuel Kant e a poesia de Friedrich Schiller.Todo músico competente tem algo de hipnotizador, pois é capaz de fazer com que o ouvinte sensível, perceba o mundo a partir do seu estado de espírito. A intensidade e a profundidade dos sentimentos apresentadas na música erudita e no jazz, pelos mestres destes gêneros, não tem paralelo em nem um outro estilo musical. Somando-se a isso, a qualidade estética que, aliás, pode ser medida, (pois a nota LÁ, por exemplo, vibra em exatos 440Hz), a variedade de formatos e a liberdade com que estes podem ser explorados pelos bons compositores e instrumentistas, fazem daqueles gêneros, o ápice desta forma de arte que chamamos de música. O que me incomoda, é quando algum estudante de sociologia, história ou filosofia me diz que eu não posso achar Wes Montgomery superior ao Tiririca. Nessas horas me dá vontade de mandar o neo-stalinista a merda, pois se eu respeito, e muito, Bach e companhia, e tudo o que estes representam, anos e anos escutando rock em todas as suas vertentes, me ensinaram que às vezes, um grito é mais eficaz que mil silogismos.


Alessandro Côrtes

Postado por Camila Age
Na foto: John Coltrane e Miles Davis




quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Você é música para meus ouvidos







— Amor, você me dá aquela estrela ali?

— Eu te darei o céu meu bem e o meu amor também.

— Você me ama? De verdade?

— Amo-te tanto, meu amor... não cante / O humano coração com mais verdade... / Amo-te como amigo e como amante / Numa sempre diversa realidade. / Amo-te afim, de um calmo amor prestante / E te amo além, presente na saudade. / Amo-te, enfim, com grande liberdade / Dentro da eternidade e a cada instante...

— Que lindo, meu amor. Não te dá medo? Todo esse amor?

— Ah! Deixa pra lá meu amor / Vem comigo e esquece / Este drama ou o que for / Sem sentido / Ama não ama se ama me chama / Que eu vou...

— Eu também vou. Mas quero que dure pra sempre...

— Amor da minha vida, / Daqui até a eternidade / Nossos destinos foram traçados na maternidade...

— Ufa! Se é assim... Se essa felicidade durar a vida toda... mas me diz, onde você estava todo esse tempo?

— Vivia a te buscar / Porque pensando em ti / Corria contra o tempo / Eu descartava os diasEm que não te vi / Como de um filme / A ação que não valeu / Rodava as horas pra trás / Roubava um pouquinho / E ajeitava o meu caminho / Pra encostar no teu...

— Ah, você é perfeito. Casa comigo???


Mônica Wojciechowski

terça-feira, 25 de setembro de 2007

Música

Ele é músico. Tem o olhar melancólico dos que pensam demais. Conhece todos os CD’s do Leonard Cohen. Tem mania de se abraçar no violão quando não consegue me dizer o que está pensando.

Ele acha que eu não gosto das músicas que ele faz. Talvez seja verdade. Nem presto atenção. Gosto quando ele canta bem baixinho:

“If you want a lover

I'll do anything you ask me to

And if you want another kind of love

I'll wear a mask for you

If you want a partner

Take my hand

Or if you want to strike me down in anger

Here I stand

I'm your man”

Eu sei, eu sei.

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Dia Branco

Se você vier
 Pro que der e vier
 Comigo
 Eu te prometo o sol
 Se hoje o sol sair
 Ou a chuva
 Se a chuva cair
 Se você vier
 Até onde a gente chegar
 Numa praça na beira do mar
 Num pedaço de
 qualquer lugar
 Nesse dia branco
 Se branco ele for
 Esse tanto, esse canto
 de amor
 Se você quiser e vier
 Pro que der e vier comigo


Composição: Geraldo Azevedo/ Renato Rocha

postado por Carlota Joaquina



domingo, 23 de setembro de 2007

TEMA DA SEMANA: MÚSICA


AMPUTARAM A PERNA CURTA DA MENTIRA

Amputaram a perna curta da mentira.
A partir daí, ela não deu mais nenhum passo adiante.
E o marido traíra nunca mais disse que ficara no escritório até mais tarde, quando na verdade tava levando parte do escritório pro motel.
O depressivo nunca mais respondeu “tudo” quando lhe cumprimentaram com um “oi, tudo bem?”
A garota resolveu repensar seu visual, pois ninguém mais dizia que ela tava ótima com aquele corte horrível.
O mocinho que tinha aversão a comemorar seus aniversários teve que se acostumar a receber de todos felicitações no dia certo, já que não pôde mais esconder tal data.
A filha adolescente se obrigou a contar aos pais que estava namorando, pois não conseguia mais dizer que estava saindo à noite com as “amigas do colégio”.
Os advogados perderam muitas causas – e muito dinheiro.

E o mundo entrou em conflito, mas logo se acostumou a lidar com a verdade...

Sabrina Moreira