XMMXCS 2215-1738: este é o nome do enxame de galáxias mais distante do universo. Localiza-se a dez bilhões de anos-luz da Terra. Tendo feito descobertas com nomes e conteúdos tão complexos e a distâncias absolutamente inimagináveis, como o homem poderia estar falhando em outra tão próxima? Todos os dias, dobrando a esquina, parando no sinal vermelho, caminhando por escritórios, casas e corredores, desfilando, debochando de sua incapacidade, ridicularizando todos os seus esforços, bem debaixo do seu nariz (muitas vezes literalmente).
Mas, depois de décadas de estudo e mistério, e graças aos exacerbados avanços da nanotecnologia, o homem estava próximo de decifrar este que é um dos maiores enigmas do universo: o Ponto G. Com equipamentos e estudos de biomecânica desenvolvidos desde antes dos tempos da Guerra Fria, um seleto grupo de cientistas internacionais montou, em Belgorod, na parte ocidental da Rússia, um veículo microscópico, munido de uma minúscula câmera digital e um disparador de ondas em alta freqüência. Foi implantado em uma jovem de nome não identificado. Sua escolha se deu após muita pesquisa, ampla triagem, entrevistas individuais e coletivas, testes físicos, exames ginecológicos minuciosos e outros estudos que pudessem afirmar ser ela a mulher padrão, em termos globais, quanto ao comportamento e estímulo sexuais. Nem frígida, nem ninfomaníaca: 103 relações sexuais por ano, 18 minutos na média de tempo em cada relação, 53% de índice de satisfação sexual e 52% de vezes não atingindo o orgasmo.
A pequena nave foi introduzida no corpo vaginal pelo ginecologista tcheco Jansen Trefulka logo no início da manhã, com a paciente (evitaram o termo cobaia) em jejum e depois de uma noite de dez horas de sono inspecionado a cada 15 minutos, pois teria de permanecer constantemente acordada para monitoramento de suas reações e batimentos cardíacos. Era também fundamental que ela estivesse consciente, pois o estímulo não poderia ser fruto de um sonho ou pensamento excitante. O ambiente, embora absolutamente asséptico, não lembrava em nada um laboratório de pesquisas: era um quarto com uma cama de casal confortável. Lençóis e paredes em tons pastéis para não haver influência de fatores ambientais (objetos em cores quentes estavam absolutamente fora de questão, mesmo que fossem equipamentos de pesquisa). Até a temperatura era mantida em equilíbrio, nem quente, nem fria.
Pela câmera instalada no teto, logo acima de cama, os cientistas observavam as reações faciais de Eva (pseudônimo que lhe foi dado de última hora). Seus cabelos extremamente negros cobriam a face de pele clara quando ela virava-se de lado. Os pesquisadores pensaram em avisá-la pelo microfone, mas a própria Eva logo se deu conta de poder estar atrapalhando os estudos, voltando então a ficar com o rosto de frente para o teto. Todos temeram que aquela posição fixa e o ambiente formal do quarto, apesar dos esforços em deixá-lo aconchegante, travassem as emoções de Eva. Mas sua respiração, batimentos cardíacos e grau de constrição de músculos e vasos sangüíneos demonstraram que ela estava se sentindo à vontade.
Nada de música, massagem, aromas ou qualquer outro estímulo para deixá-la relaxada. A ingestão de qualquer remédio, álcool ou mesmo tabaco foi proibida nas 48 horas que antecederam o início da pesquisa. Chegaram até mesmo a orientá-la a não pensar em homens, bonitos ou feios, enquanto durassem os trabalhos. A intenção era pura e simplesmente descobrir se de fato havia um botão em Eva capaz de fazê-la explodir em orgasmos, independentemente das circunstâncias ao redor. Seria a revolução, conforme afirmava o líder da equipe, Oleg Tsiolkówsky, o magnata russo que financiou o projeto, mas que nunca estava presente nas pesquisas (inclusive nesta). Susumu Emoto, o mais marqueteiro do grupo de quatro cientistas internacionais, já planejava cápsulas estimulantes e dispositivos intra-vaginais dotados de pulsões com precisão cirúrgica. Já Craig Wakefield elaborava mentalmente um livro intitulado “A Democracia do Orgasmo”, dando conta de todos os atalhos para se chegar ao nirvana. Por sua vez, Hanz Schwärzler, primo do Duque de Liechtenstein (a quem cogitava vender os segredos resultantes do projeto), lançava-se em sonhos de megalomania: “seremos maiores que Kinsey, Johnson e Masters juntos”, bradava. Por fim, Trefulka sustentava uma série de temores passíveis de ser tanto coerentes quanto estapafúrdios: poderia a descoberta dispensar os homens no ato sexual devido à maior facilidade de auto-estimulação feminina? Ou poderiam os homens criar artifícios tecnológicos capazes de escravizar ou aliciar as mulheres a partir do comando do Ponto G? E quais eram os riscos de haver dependência física na estimulação constante do tal ponto? O fato é que a curiosidade sobre o maior enigma da humanidade era mais forte do que temores ou bom senso. Sob o pretexto de fazer a ciência navegar longe das amarras que quase condenaram Galileu (que decifrou o universo mas nunca sequer ouviu falar em Ponto G), o quarteto abaixou as luzes do quarto-laboratório, ligou o infra-vermelho da câmera no teto e acionou os equipamentos da G1 – nome do minúsculo dispositivo que boiava sem rumo no corpo de Eva.
As luzes externas da G1 são acionadas. A primeira visão desanima Wakefield, pois a nitidez das imagens do tubo vaginal é baixíssima. Mas o trabalho principal não é visual, é tátil. Liga-se então o disparador de ondas em alta freqüência. Primeiramente, na tela do computador, é construído um holograma de todo o canal vaginal. Uma vez mapeado, a G1 passa a disparar as ondas de alta freqüência, rastreando as paredes do tecido em 360 graus ao redor de si, partindo da entrada da vagina (em ponto próximo às glândulas de Bartholin, responsáveis pela secreção de líqüidos na estimulação sexual) e prosseguindo em direção ao colo do útero. Um trabalho exaustivo e demorado, explorando cada micromilímetro daquele universo cilíndrico e de relevo irregular. Eva nada sente. Nem prazer, nem incômodo, nem mesmo cócegas. O único estímulo que tivera naquela manhã se deu durante a introdução do dispositivo, quando Trefulka, sem nenhuma intenção, pressionou seu clitóris por breves segundos. Apática e já entediada após três horas e nove minutos de busca infrutífera, sua respiração e batimentos cardíacos começam a entrar na freqüência próxima do sono.
Após metade da cavidade vaginal ser meticulosamente inspecionada, o quarteto já teme estar compondo a pantomima científica de um embuste colossal. Mas pelo menos teriam o mérito de desmentir o mito, de derrubar a lenda com análise absolutamente rigorosa. Já seria um grande feito, sem equivalentes históricos. Nem mesmo descobrir (ou matar) o Monstro do Lago Ness poderia fazer sombra. Logicamente que deveriam repetir a pesquisa com outras mulheres, mas sabiam que Eva era um exemplar (esse termo usavam sem pudores) saudável e absolutamente dentro dos padrões normais de sexualidade. O erro em sua escolha era de uma probabilidade remotíssima. Mas eles sabiam que a “glória” de fincar o pé na história como os cientistas que comprovaram a inexistência do misterioso ponto era um prêmio-consolação. Pior que isso, era uma maldição. Seriam lembrados por homens e mulheres do mundo todo como o quarteto que implodiu um enigma fascinante, que acabou com a brincadeira, que zombou da humanidade ao dinamitar um caminho que era mais divertido do que o próprio destino. O cidadão comum teria de voltar seus olhos novamente aos céus, contentando-se com o mistério de existir ou não uma raça alienígena, imaginando se pelo menos as fêmeas da espécie teriam Ponto G. Seria resgatada a hegemonia do clitóris, mesmo tendo Freud afirmado ser o orgasmo vaginal aquele verdadeiramente delegado às mulheres sexualmente maduras. Pessoas de todas as nacionalidades apontariam os integrantes do quarteto com ira nas ruas, talvez tivessem até de criar uma nova identidade, mudar o rosto em algum colega cirurgião plástico. E o mais vergonhoso para um profissional da alta pajelança: nada lucrariam com o feito.
Terminado o intervalo de almoço, voltaram todos a seus postos. Eva comeu uma pequena porção de pelmeni, uma espécie de ravióli russo, coberta por uma rala camada de nata - para não pesar no estômago e fazer a oxigenação descer para a digestão, gerando sonolência. Eva bebe um pequeno gole de água que desce gelado ao passar pelos dentes recém-escovados. Deita-se e espera. Ela nada sente, mas, no silêncio interno do seu corpo, a G1 é novamente acionada. Desta vez com a imagem parecendo um pouco mais nítida nos monitores. O tempo corre, a G1 inspeciona, Eva tenta lembrar das bolsas que cobiçara nas férias passadas no balneário de Koktebel, em Odessa, para evitar pensar em homens. Um exercício difícil porque queria as bolsas para ficar mais elegante, e queria ficar mais elegante para conquistar homens. Resta apenas ¼ do duto vaginal. Os quatro pesquisadores já estão se acostumando com a idéia da derrota. Eva concentra-se para não cair no sono. Já esqueceu das bolsas. E dos homens. Gostaria apenas de estar em casa, cuidando de seu gato angorá e preparando o pelmeni que aprendeu com a mãe, pois a porção do almoço ficou devendo. Até que, de súbito, sua pupila se dilata ao mesmo tempo em que ela emana um “uh!” seco, quase involuntário, acompanhado de uma leve contorção do corpo e colisão dos joelhos e coxas. Schwärzler é o primeiro a perceber, testemunhando a reação pela câmera. Trefulka flagra o salto repentino dos batimentos cardíacos. Wakefield confirma o estímulo pela marcação de respiração mais ofegante e manifestação de calor repentino na região pubiana. Emoto nota que aquele breve e misterioso momento foi acompanhado de uma ligeira microdescarga elétrica, gerada pelo próprio corpo de Eva. Constatam que não se tratou de um orgasmo, mas que foi, sim, uma forte pulsão de libido. Pela câmera da G1 não se consegue visualizar muito. A nave parece estar à deriva. Os líquidos íntimos de Eva são liberados em profusão, numa corrente que quase tira a G1 de controle. De repente, conseguem visualizar algo: um minúsculo ponto em relevo. Sua cor parece oscilar entre o púrpura e o azul, destacando-se saliente em meio à carne vermelha. A bojuda partícula chama a atenção no relevo rugoso por sua convexidade absolutamente uniforme, uma semi-esfera saltando reluzente para fora do tecido vaginal. Uma protuberância mínima, algo como um pixel na tela de um computador. Pareceria um microematoma, não fosse sua delicada e misteriosa fluorescência rósea. Tudo indicava estarem diante da terra prometida de Ernest Gräfenberg.
Wakefield segura o joystick tentando controlar seus reflexos. Nunca, nem mesmo em sua primeira cirurgia, se sentiu tão nervoso. Esforça-se para não tremer. Consegue então aproximar a G1 da minúscula bolha, que por sua vez parece encarar a nave de forma serena e ao mesmo tempo desafiadora. Todos os quatro se precipitam para a frente do monitor principal, esticando seus pescoços a fim de apreciar a relíquia científica. No quarto, Eva tenta se recuperar do breve momento de êxtase. Ofegante, busca decifrar o que se passou. Pálpebras semi-cerradas, peito arfando e a expectativa de um novo estímulo. Segura firme o lençol, apertando-o com toda força, a ponto de sentir doer os nós e pontas dos dedos.
Na sala de controle, Emoto se entusiasma, mas fala de maneira contida aos colegas que é preciso aplicar novo estímulo com as ondas de alta freqüência. Schwärzler e Trefulka consentem, olhando para Wakefield ansiosos. Wakefield dispara o botão. Novo estímulo. Eva novamente se contorce, agora de forma mais demorada e intensa. Mesmo sabendo estar sendo observada, ela não consegue se conter. No monitor, o ponto se encolhe e se expande. A lubrificação íntima chega a níveis altíssimos. Emoto então assume o segundo joystick. De forma heróica consegue manter o controle da nave, aproximá-la do ponto e cravar duas micropinças no tecido vaginal, fixando a G1 bem em frente de seu alvo. Eva começa a suar. Os joelhos tremem. Entre perplexa e excitada, olha boquiaberta para a câmera no teto, como que esperando pelo golpe de misericórdia. Quase implora com os olhos.
Emoto agora ordena um aumento de freqüência para terem certeza do que está acontecendo. Schwärzler dobra o estímulo. Mas Trefulka gira o botão para a potência máxima. Wakefield olha para os colegas temeroso, recebendo em troca ares de intimidação. Sente então que a expedição chegou de fato ao clímax em todos os sentidos. Ele já não pode mais disfarçar o tremor de seu dedo em cima do botão, quase não consegue pressioná-lo. Então, fecha os olhos e dispara.
Eva lança o tronco para cima num sobressalto instantâneo, com os olhos fechados e a cabeça pendendo para trás, numa convulsão que surpreende os cientistas. Saltam os bicos dos seios, as coxas se comprimem, a barriga se recolhe, os músculos de todo o corpo se retesam, um arrepio de febre parece chegar a inflar o lençol. Wakefield pega o telefone vermelho para chamar o socorro dos paramédicos, mas é impedido por Emoto. Eva parece possuída, grita e se contorce violentamente, esfregando costas, pernas e braços por toda a área do colchão. Trefulka esboça um sorriso nervoso, com os olhos grudados na tela. Mas, repentinamente, passam a observar no monitor uma reação não prevista: o pequeno ponto estimulado se encolhe até deixar de ser uma protuberância, sua cor muda para o roxo e, em seguida, para o vermelho, confundindo-se com todo o tecido vaginal. No holograma, ele também some, como se nunca tivesse existido. A G1 volta a ficar agitada pela turbulência ao seu redor, mas agora não só pela abundante secreção de líquidos. Toda a cavidade vaginal parece querer expelir o micro-objeto. Ela se comprime e se expande vigorosamente, como se tivesse vida e vontade próprias. As pinças não conseguem mais segurar a G1 e ela é então projetada para a maré íntima de Eva, ficando mais uma vez à deriva. Nem Wakefield nem Emoto conseguem manter o controle, deixando o dispositivo navegar ao sabor do fluxo. Trefulka pensa em pedir calma pelo microfone, mas Schwärzler segura sua mão no botão on/off ao notar que não há mais o que fazer. Sem entender, os quatro estudiosos apenas observam, impotentes, a pequena nave sendo expelida do corpo vaginal, entrando logo depois em curto-circuito.
Enquanto isso, do outro lado do planeta, o mecânico Rafael também procura o Ponto G de outra Eva, sua namorada. Deitados na grama, lendo poesia.
Meninas de Carne
Você é ou conhece a garota da foto? Então, manifeste-se.
Se não conhece a figura, tente identificá-la no meu Orkut: http://www.orkut.com/Profile.aspx?uid=13286287392859360604.
A primeira pessoa que responder corretamente seu nome e sobrenome nos comentários, deixando ali algum canal para contato, ganhará um DVD do filme “Dermografia”, que tem minha concepção, roteirização e assistência de direção (estréia em breve no cinema).
Texto e foto: Mario Lopes
Mas, depois de décadas de estudo e mistério, e graças aos exacerbados avanços da nanotecnologia, o homem estava próximo de decifrar este que é um dos maiores enigmas do universo: o Ponto G. Com equipamentos e estudos de biomecânica desenvolvidos desde antes dos tempos da Guerra Fria, um seleto grupo de cientistas internacionais montou, em Belgorod, na parte ocidental da Rússia, um veículo microscópico, munido de uma minúscula câmera digital e um disparador de ondas em alta freqüência. Foi implantado em uma jovem de nome não identificado. Sua escolha se deu após muita pesquisa, ampla triagem, entrevistas individuais e coletivas, testes físicos, exames ginecológicos minuciosos e outros estudos que pudessem afirmar ser ela a mulher padrão, em termos globais, quanto ao comportamento e estímulo sexuais. Nem frígida, nem ninfomaníaca: 103 relações sexuais por ano, 18 minutos na média de tempo em cada relação, 53% de índice de satisfação sexual e 52% de vezes não atingindo o orgasmo.
A pequena nave foi introduzida no corpo vaginal pelo ginecologista tcheco Jansen Trefulka logo no início da manhã, com a paciente (evitaram o termo cobaia) em jejum e depois de uma noite de dez horas de sono inspecionado a cada 15 minutos, pois teria de permanecer constantemente acordada para monitoramento de suas reações e batimentos cardíacos. Era também fundamental que ela estivesse consciente, pois o estímulo não poderia ser fruto de um sonho ou pensamento excitante. O ambiente, embora absolutamente asséptico, não lembrava em nada um laboratório de pesquisas: era um quarto com uma cama de casal confortável. Lençóis e paredes em tons pastéis para não haver influência de fatores ambientais (objetos em cores quentes estavam absolutamente fora de questão, mesmo que fossem equipamentos de pesquisa). Até a temperatura era mantida em equilíbrio, nem quente, nem fria.
Pela câmera instalada no teto, logo acima de cama, os cientistas observavam as reações faciais de Eva (pseudônimo que lhe foi dado de última hora). Seus cabelos extremamente negros cobriam a face de pele clara quando ela virava-se de lado. Os pesquisadores pensaram em avisá-la pelo microfone, mas a própria Eva logo se deu conta de poder estar atrapalhando os estudos, voltando então a ficar com o rosto de frente para o teto. Todos temeram que aquela posição fixa e o ambiente formal do quarto, apesar dos esforços em deixá-lo aconchegante, travassem as emoções de Eva. Mas sua respiração, batimentos cardíacos e grau de constrição de músculos e vasos sangüíneos demonstraram que ela estava se sentindo à vontade.
Nada de música, massagem, aromas ou qualquer outro estímulo para deixá-la relaxada. A ingestão de qualquer remédio, álcool ou mesmo tabaco foi proibida nas 48 horas que antecederam o início da pesquisa. Chegaram até mesmo a orientá-la a não pensar em homens, bonitos ou feios, enquanto durassem os trabalhos. A intenção era pura e simplesmente descobrir se de fato havia um botão em Eva capaz de fazê-la explodir em orgasmos, independentemente das circunstâncias ao redor. Seria a revolução, conforme afirmava o líder da equipe, Oleg Tsiolkówsky, o magnata russo que financiou o projeto, mas que nunca estava presente nas pesquisas (inclusive nesta). Susumu Emoto, o mais marqueteiro do grupo de quatro cientistas internacionais, já planejava cápsulas estimulantes e dispositivos intra-vaginais dotados de pulsões com precisão cirúrgica. Já Craig Wakefield elaborava mentalmente um livro intitulado “A Democracia do Orgasmo”, dando conta de todos os atalhos para se chegar ao nirvana. Por sua vez, Hanz Schwärzler, primo do Duque de Liechtenstein (a quem cogitava vender os segredos resultantes do projeto), lançava-se em sonhos de megalomania: “seremos maiores que Kinsey, Johnson e Masters juntos”, bradava. Por fim, Trefulka sustentava uma série de temores passíveis de ser tanto coerentes quanto estapafúrdios: poderia a descoberta dispensar os homens no ato sexual devido à maior facilidade de auto-estimulação feminina? Ou poderiam os homens criar artifícios tecnológicos capazes de escravizar ou aliciar as mulheres a partir do comando do Ponto G? E quais eram os riscos de haver dependência física na estimulação constante do tal ponto? O fato é que a curiosidade sobre o maior enigma da humanidade era mais forte do que temores ou bom senso. Sob o pretexto de fazer a ciência navegar longe das amarras que quase condenaram Galileu (que decifrou o universo mas nunca sequer ouviu falar em Ponto G), o quarteto abaixou as luzes do quarto-laboratório, ligou o infra-vermelho da câmera no teto e acionou os equipamentos da G1 – nome do minúsculo dispositivo que boiava sem rumo no corpo de Eva.
As luzes externas da G1 são acionadas. A primeira visão desanima Wakefield, pois a nitidez das imagens do tubo vaginal é baixíssima. Mas o trabalho principal não é visual, é tátil. Liga-se então o disparador de ondas em alta freqüência. Primeiramente, na tela do computador, é construído um holograma de todo o canal vaginal. Uma vez mapeado, a G1 passa a disparar as ondas de alta freqüência, rastreando as paredes do tecido em 360 graus ao redor de si, partindo da entrada da vagina (em ponto próximo às glândulas de Bartholin, responsáveis pela secreção de líqüidos na estimulação sexual) e prosseguindo em direção ao colo do útero. Um trabalho exaustivo e demorado, explorando cada micromilímetro daquele universo cilíndrico e de relevo irregular. Eva nada sente. Nem prazer, nem incômodo, nem mesmo cócegas. O único estímulo que tivera naquela manhã se deu durante a introdução do dispositivo, quando Trefulka, sem nenhuma intenção, pressionou seu clitóris por breves segundos. Apática e já entediada após três horas e nove minutos de busca infrutífera, sua respiração e batimentos cardíacos começam a entrar na freqüência próxima do sono.
Após metade da cavidade vaginal ser meticulosamente inspecionada, o quarteto já teme estar compondo a pantomima científica de um embuste colossal. Mas pelo menos teriam o mérito de desmentir o mito, de derrubar a lenda com análise absolutamente rigorosa. Já seria um grande feito, sem equivalentes históricos. Nem mesmo descobrir (ou matar) o Monstro do Lago Ness poderia fazer sombra. Logicamente que deveriam repetir a pesquisa com outras mulheres, mas sabiam que Eva era um exemplar (esse termo usavam sem pudores) saudável e absolutamente dentro dos padrões normais de sexualidade. O erro em sua escolha era de uma probabilidade remotíssima. Mas eles sabiam que a “glória” de fincar o pé na história como os cientistas que comprovaram a inexistência do misterioso ponto era um prêmio-consolação. Pior que isso, era uma maldição. Seriam lembrados por homens e mulheres do mundo todo como o quarteto que implodiu um enigma fascinante, que acabou com a brincadeira, que zombou da humanidade ao dinamitar um caminho que era mais divertido do que o próprio destino. O cidadão comum teria de voltar seus olhos novamente aos céus, contentando-se com o mistério de existir ou não uma raça alienígena, imaginando se pelo menos as fêmeas da espécie teriam Ponto G. Seria resgatada a hegemonia do clitóris, mesmo tendo Freud afirmado ser o orgasmo vaginal aquele verdadeiramente delegado às mulheres sexualmente maduras. Pessoas de todas as nacionalidades apontariam os integrantes do quarteto com ira nas ruas, talvez tivessem até de criar uma nova identidade, mudar o rosto em algum colega cirurgião plástico. E o mais vergonhoso para um profissional da alta pajelança: nada lucrariam com o feito.
Terminado o intervalo de almoço, voltaram todos a seus postos. Eva comeu uma pequena porção de pelmeni, uma espécie de ravióli russo, coberta por uma rala camada de nata - para não pesar no estômago e fazer a oxigenação descer para a digestão, gerando sonolência. Eva bebe um pequeno gole de água que desce gelado ao passar pelos dentes recém-escovados. Deita-se e espera. Ela nada sente, mas, no silêncio interno do seu corpo, a G1 é novamente acionada. Desta vez com a imagem parecendo um pouco mais nítida nos monitores. O tempo corre, a G1 inspeciona, Eva tenta lembrar das bolsas que cobiçara nas férias passadas no balneário de Koktebel, em Odessa, para evitar pensar em homens. Um exercício difícil porque queria as bolsas para ficar mais elegante, e queria ficar mais elegante para conquistar homens. Resta apenas ¼ do duto vaginal. Os quatro pesquisadores já estão se acostumando com a idéia da derrota. Eva concentra-se para não cair no sono. Já esqueceu das bolsas. E dos homens. Gostaria apenas de estar em casa, cuidando de seu gato angorá e preparando o pelmeni que aprendeu com a mãe, pois a porção do almoço ficou devendo. Até que, de súbito, sua pupila se dilata ao mesmo tempo em que ela emana um “uh!” seco, quase involuntário, acompanhado de uma leve contorção do corpo e colisão dos joelhos e coxas. Schwärzler é o primeiro a perceber, testemunhando a reação pela câmera. Trefulka flagra o salto repentino dos batimentos cardíacos. Wakefield confirma o estímulo pela marcação de respiração mais ofegante e manifestação de calor repentino na região pubiana. Emoto nota que aquele breve e misterioso momento foi acompanhado de uma ligeira microdescarga elétrica, gerada pelo próprio corpo de Eva. Constatam que não se tratou de um orgasmo, mas que foi, sim, uma forte pulsão de libido. Pela câmera da G1 não se consegue visualizar muito. A nave parece estar à deriva. Os líquidos íntimos de Eva são liberados em profusão, numa corrente que quase tira a G1 de controle. De repente, conseguem visualizar algo: um minúsculo ponto em relevo. Sua cor parece oscilar entre o púrpura e o azul, destacando-se saliente em meio à carne vermelha. A bojuda partícula chama a atenção no relevo rugoso por sua convexidade absolutamente uniforme, uma semi-esfera saltando reluzente para fora do tecido vaginal. Uma protuberância mínima, algo como um pixel na tela de um computador. Pareceria um microematoma, não fosse sua delicada e misteriosa fluorescência rósea. Tudo indicava estarem diante da terra prometida de Ernest Gräfenberg.
Wakefield segura o joystick tentando controlar seus reflexos. Nunca, nem mesmo em sua primeira cirurgia, se sentiu tão nervoso. Esforça-se para não tremer. Consegue então aproximar a G1 da minúscula bolha, que por sua vez parece encarar a nave de forma serena e ao mesmo tempo desafiadora. Todos os quatro se precipitam para a frente do monitor principal, esticando seus pescoços a fim de apreciar a relíquia científica. No quarto, Eva tenta se recuperar do breve momento de êxtase. Ofegante, busca decifrar o que se passou. Pálpebras semi-cerradas, peito arfando e a expectativa de um novo estímulo. Segura firme o lençol, apertando-o com toda força, a ponto de sentir doer os nós e pontas dos dedos.
Na sala de controle, Emoto se entusiasma, mas fala de maneira contida aos colegas que é preciso aplicar novo estímulo com as ondas de alta freqüência. Schwärzler e Trefulka consentem, olhando para Wakefield ansiosos. Wakefield dispara o botão. Novo estímulo. Eva novamente se contorce, agora de forma mais demorada e intensa. Mesmo sabendo estar sendo observada, ela não consegue se conter. No monitor, o ponto se encolhe e se expande. A lubrificação íntima chega a níveis altíssimos. Emoto então assume o segundo joystick. De forma heróica consegue manter o controle da nave, aproximá-la do ponto e cravar duas micropinças no tecido vaginal, fixando a G1 bem em frente de seu alvo. Eva começa a suar. Os joelhos tremem. Entre perplexa e excitada, olha boquiaberta para a câmera no teto, como que esperando pelo golpe de misericórdia. Quase implora com os olhos.
Emoto agora ordena um aumento de freqüência para terem certeza do que está acontecendo. Schwärzler dobra o estímulo. Mas Trefulka gira o botão para a potência máxima. Wakefield olha para os colegas temeroso, recebendo em troca ares de intimidação. Sente então que a expedição chegou de fato ao clímax em todos os sentidos. Ele já não pode mais disfarçar o tremor de seu dedo em cima do botão, quase não consegue pressioná-lo. Então, fecha os olhos e dispara.
Eva lança o tronco para cima num sobressalto instantâneo, com os olhos fechados e a cabeça pendendo para trás, numa convulsão que surpreende os cientistas. Saltam os bicos dos seios, as coxas se comprimem, a barriga se recolhe, os músculos de todo o corpo se retesam, um arrepio de febre parece chegar a inflar o lençol. Wakefield pega o telefone vermelho para chamar o socorro dos paramédicos, mas é impedido por Emoto. Eva parece possuída, grita e se contorce violentamente, esfregando costas, pernas e braços por toda a área do colchão. Trefulka esboça um sorriso nervoso, com os olhos grudados na tela. Mas, repentinamente, passam a observar no monitor uma reação não prevista: o pequeno ponto estimulado se encolhe até deixar de ser uma protuberância, sua cor muda para o roxo e, em seguida, para o vermelho, confundindo-se com todo o tecido vaginal. No holograma, ele também some, como se nunca tivesse existido. A G1 volta a ficar agitada pela turbulência ao seu redor, mas agora não só pela abundante secreção de líquidos. Toda a cavidade vaginal parece querer expelir o micro-objeto. Ela se comprime e se expande vigorosamente, como se tivesse vida e vontade próprias. As pinças não conseguem mais segurar a G1 e ela é então projetada para a maré íntima de Eva, ficando mais uma vez à deriva. Nem Wakefield nem Emoto conseguem manter o controle, deixando o dispositivo navegar ao sabor do fluxo. Trefulka pensa em pedir calma pelo microfone, mas Schwärzler segura sua mão no botão on/off ao notar que não há mais o que fazer. Sem entender, os quatro estudiosos apenas observam, impotentes, a pequena nave sendo expelida do corpo vaginal, entrando logo depois em curto-circuito.
Enquanto isso, do outro lado do planeta, o mecânico Rafael também procura o Ponto G de outra Eva, sua namorada. Deitados na grama, lendo poesia.
Meninas de Carne
Você é ou conhece a garota da foto? Então, manifeste-se.
Se não conhece a figura, tente identificá-la no meu Orkut: http://www.orkut.com/Profile.aspx?uid=13286287392859360604.
A primeira pessoa que responder corretamente seu nome e sobrenome nos comentários, deixando ali algum canal para contato, ganhará um DVD do filme “Dermografia”, que tem minha concepção, roteirização e assistência de direção (estréia em breve no cinema).
Texto e foto: Mario Lopes
17 comentários:
aninha raposo.
Lopes,
meio viajante esse e ainda com jabá no final. Se está ficando muito capitalista.... Eu acho que a menina da foto é a Ana Paula Taques, mas como o concurso é só para mulheres fica a dica, se eu estiver certo.
Abs
Schneider
a eterna busca...
pobres cientistas. eles acham mesmo que uma máquina conseguiria descobrir os segredos do corpo feminino??? quanta petulância... huahauahuahua.
o texto está delicioso Mario. sabe quando a gente consegue entrar no texto? vizualizar as cenas? filminho passando na cabeça...? fiquei ansiosa esperando o final... não consegui tirar o olho da tela...
otÉmo. como sempre!
mopi.
Anônimo, infelizmente, como não sei quem você, nem onde mora, não terei como enviar a você o prêmio. hehehe
Anônimo 2. Como você abriu do seu prêmio, não terei também como enviá-lo a você. hehehehe
Mopi, vc sabe atingir o ponto G da minha vaidade. hahahahahaha (ei, q tal aproveitar as dicas dos dois aí de cima e ganhar um DVD totalmente de grátis? ;-))
então, eu digo que é a... aninha tavares. hauhauhauhauahhaua.
ou ganhei o dvd só por acertar o ponto g? acho que seria muito justo...
hehehehee.
E a resposta está eeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeee... rrada. hahahahahahahaha Mopi, rsrsrsrs, q horror, rsrsrsrs. Essa é bem mais fácil q acertar o ponto G, vai. ;-)
é a carlota joaquina, de peruca? ou então... ah, mario...
HAHAHAAHAHAHAHAHAHAHA A Carlota vai ficar fula com o comentário. hahahahahaha Mas boa tentativa. Vai pegando a lista de amigas e chutando: é fulana de peruca, é ciclana de peruca, vai que dá certo. rsrsrsrs
sou eu de peruca?
hahahahahaahhahaha Olha q não deixa de ser um fetiche interessante, hein. Imagina, assim de melindrosa, tipo no filme Chicago, de meia arrastão e mini saia... ops, já tô quase escrevendo outro conto. hahahaha Boa tentativa, Mopi. ;-)
Hei, não sou eu não.
Não fico puta da cara não. seria engraçado eu, agora de cabelo preto, usando peruca preta huahuhauhuhauhauhuahuahuhauha
Beijosssss
carlota etc e tal
Olhe, estou começando a achar que nossa nova amiga Cleusa!
Carlota etc e tal
Mario preste atenção:
Vc se posiciona virado pra Meca e direciona o colovelo ao contrário, gira em torno de 180º e torce pra ser ali hahahahahahahaha
beijosssssss
Maravilhoso como sempre!
Carlota e etc e tal
Valeu, Carlitcha. Vou seguir o conselho de virar pra Meca, mexer o cotovelo e... ah, isso tudo q vc disse. rs Não, não é a Cleusa, não. hehehe Mas vai tentando. ;-) Beijão.
Sou c/nariz mais arrebitado!
Postar um comentário