domingo, 9 de setembro de 2007

A Passagem




Se o gato morresse amanhã, estaria hoje dormindo, encantadoramente, sob o escaldante sol que lhe colore a íris e reduz a um traço suas diminutivas pupilas.

Se a tulipa morresse amanhã, estaria sorvendo com vigor o orvalho fresco trazido pela chuva fina que anuncia o amanhecer.

Se o lápis morresse amanhã, estaria hoje sendo empunhado de canhota, fazendo nascer um belo poema de métrica simples e sentimento nobre.

Se o beijo morresse amanhã, estaria hoje acendendo em dois corpos um incontrolável e delicioso desejo, através do compasso sincronizado de duas línguas que costumavam estar, até então, distanciadas.

Se o poder morresse amanhã, hoje estaria ostentando como nunca sua coroa e cetro, ou então-paradoxo!- estaria abandonando o trono, sem hesitar.

Se a amizade morresse amanhã, hoje estaria sorrindo de felicidade e chorando de saudades, agradecendo aos deuses por um dia ter sido tão, absolutamente, viva.

Se a palavra morresse amanhã, estaria hoje transcendendo todos os idiomas, assumindo que a única palavra que interessa é AMOR.

Se eu morresse amanhã, todo meu universo estaria funcionando com uma dose extra de prazer, despedindo-se comigo, de maneira sublime, dessa vida repleta de abstrações.

Sabrina Moreira

3 comentários:

Anônimo disse...

Querida Miss Sunday,
depois de uns domingos de ocaso, releio um texto seu que me trouxe tanto prazer... Que amor pela vida! Que vigor e delicadeza!!! adorei. Nessa última contribuição em seu dia, que eu W.Allen, faço às meninas de papel (comecei minha despedida na 5a feira passada e finalizo na 4a próxima), você me presenteou com uma bela estória. A mim e aos seus leitores.
Em retribuição dedico algumas palavras para você e um letra de música bem especial.

Você foi a primeira menina de papel que conheci. Linda, um anjo quando dança, papo agradável, inteligente, madura apesar dos seus 20 anos... (são 20, não?). É certo que nossa estória esfriou quando você se casou com Freud(rsss) e fez aquele texto tão duro sobre o inverno (a reação da platéia foi imediata, não?)... mas depois você tentou ser poeta e homenageou Luiz Fernando Veríssimo ... Qualquer homem de bom senso quereria estar com você por toda uma vida... Eu me satisfaço (muito mesmo, de verdade) com a sua hipotética amizade.

Desejo um lindo caminho para você. Você sabe como ninguém amar essa vida, e merece todas as contrapartidas.

Um beijo e até um dia. Quando precisar e, se desejar, alguma opinião de W.Allen, olhe para o seu que eu estarei lá. Numa estrela bem brilhante.

Para você que tem um espírito Rock and Roll, dedicar Mutantes seria o caminho mais simples. Mudei, vou de Paulinho da Viola, um mestre do amor que é do século passado e anterior a minha própria existência mas que você precisaria conhecer...

Solução de vida (Molejo Dialético)

Acreditei na paixão
E a paixão me mostrou
Que eu não tinha razão

Acreditei na razão
E a razão se mostrou
Uma grande ilusão

Acreditei no destino
E deixei-me levar
E no fim
Tudo é sonho perdido
Só desatino, dores demais

Hoje com meus desenganos
Me ponho a pensar
Que na vida, paixão e razão,
Ambas têm seu lugar

E por isso eu lhe digo
Que não é preciso
Buscar solução para a vida
Ela não é uma equação
Não tem que ser resolvida

A vida, portanto, meu caro,
Não tem solução

(Paulinho da Viola e Ferreira Gullar)

Beijos finais....

W.Allen

Anônimo disse...

Miss
Vou pedir licença para também usar seu espaço e fazer uma homenagem ao meu grande amigo Mário Lopes. Ele foi parceiro seu em alguns domingos e nos deixou saudades (a mim pelo menos).

Mário,
Eu te conheço há 6 anos. Nossa convivência nos últimos 5 foram ótimas mas menos intensas. Acho que nossas situações familiares anteriores nos travavam muito e nos contentávamos com a convivência no trabalho.
Desde o princípio reconheci as inúmeras qualidades que você tem. Obstinado, pau para toda obra, responsável, confiável, certeiro, de bem com a vida, sempre bem humorado e um dos melhores roteiristas que já conheci na vida. Como vou "morrer" e virar estrela depois de 4a feira entregaria minhas "memórias póstumas de W.Allen" tranquilamente para você escrever...
Saiba que você tem sido um grande amigo e que a minha admiração não cabe nesse espaço. Você é muito especial e como um imã, atrai igualmente pessoas maravilhosas contigo. Também, quem é que vai resistir....
Um abraço amigo. Para você eu dedico uma música do Caetano com o Milton chamada "As várias pontas de uma estrela". Espero que goste. E para você tentar entender esse inexplicável amigo, mando também um outro poeminha do Paulinho da Viola.

W.Allen

As Várias Pontas de Uma Estrela

Estrela de cinco pontas
Cinco estrelas no cruzeiro
Trilhões de estrelas no céu
Três pontas mil corações
E o menino brasileiro
Com os olhos duas contas
Atravessa o imenso véu
De brilhos e escuridões

Que Deus segue esse menino
Que deuses o seguirão
Meu verso de sete patas
Notas desta melodia
Quem me ensina essa lição
Quem me explica esse destino
Que grito dentro das matas
Agora responderia

Não sei mas ando com ele
Às vezes voamos juntos
Pedras superpreciosas
De aves nas alturas tontas
Tocamos vários assuntos
Às vezes roço-lhe a pele
E somos estrelas rosas
Três, quatro, cinco mil pontas
Pontas, pontas, pontas

_______________________

Agora, como prometido, um capítulo importante do Manual W.Allen - como entender as suas razões.

"Meu samba andou parado
Até você aparecer
mudando tudo.
Lançando por terra
o escudo do meu coração em repouso
Ontem, um rocha fria
Hoje, assim exposto.

Deixando entrar sem medo a vida
Aquilo que eu não via
Só agora eu reparei que eu não vi o seu rosto
e que vc partiu sem deixar seu nome.
Só me resta seguir rumo ao futuro
Certo do meu coração mais puro
Quem quiser que pense um pouco
Eu não posso explicar meus encontros.
Ninguém pode explicar a vida,
Num samba curto."


W.Allen

Anônimo disse...

Lindo poema....
Arrasando corações.....